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A filosofia de um homem

                                                                                                              Por Djalma Andrade

 

 

Eu cresci acreditando em Deus, e aprendi que deveria acreditar na filosofia de um homem. Você pode estar pensando que isso é negativo, mas pelo contrário, tudo o que temos nessa perspectiva é de caráter positivo.  Nenhum conhecimento jamais será suficiente para negar a existência de Deus, porém, por maior que seja a fé de uma pessoa, ela jamais estará ao alcance de manter uma relação verdadeira com Deus. Para isso, ela primeiro teria que eliminar todos os seus medos, principalmente aqueles oriundos das incertezas em relação à própria existência, sem falar dos fatores sociais. A minha preocupação com esse texto não é negar ou afirmar a existência de Deus, mas refletir sobra nossa limitada condição de manter uma relação com esse Ser.

 

 

Comprovadamente, o Homem é o único animal que é cônscio de sua existência e que sabe que vai morrer. Por ser cônscio de sua existência, pode-se indagar a respeito de sua origem (de onde vim)?, De sua existência (quem sou eu e o que estou fazendo nesse mundo)? E de seu destino (pra onde vou)? Frente a não resposta para essas três questões, o Homem se torna sabedor de que a capacidade de raciocínio que lhe é inerente não o exime de limitações e nem de faltas. 

 

Tudo que o bicho Homem inventou o fez na tentativa de suprir uma limitação. Estou certo de que tudo que se cria corresponde à extensão de um limite: o carro, por exemplo, é extensão das limitadas pernas; o telefone e o microfone são extensões de nossa limitada voz e audição; a luneta é extensão de nossa limitada visão; o avião é extensão de nosso limitado poder de voar e assim sucessivamente. Por que não podemos pensar na criação de Deus como uma extensão à vida que encontra seu limite na morte? Se tudo que o Homem faz é criar extensões para suprir seu desejo de ser o que não pode ser, é óbvio que seria um erro não existir uma extensão pela qual ele possa viver eternamente. 

 

Além de tudo, estamos falando de um ser que desde seu nascimento interagem com o mundo, com o outro. Quando o bebê nasce, o seu mundo é a mamãe, e aí ele se relaciona: chora, o peito da mamãe vem; chora, o peito da mamãe vem; até aí tudo bem, o mundo está sob seu controle. A partir da terceira amamentação, mais ou menos, o peito deixa de ser somente leite para o bebê: o peito é quente, tem o calor da mamãe, a mamãe toca, olha e fala ao amamentar. É nesse estágio que se começa a fazer as primeiras experiências de afeto.

 

 O tempo passa, e a mamãe precisa sair para cuidar de seus afazeres, de seu trabalho; ela não estará mais 24h ao lado de seu bebê. Acontece que ele vai chorar, e o peito não vai aparecer. A ausência do peito não significa unicamente a ausência de leite, mas também do calor do peito, da fala da mamãe, do olhar e do toque da mamãe... do afeto. Nessa instância, faz-se a primeira experiência da falta, é quando se descobre que o mundo não gira em torno de si, e que seu controle sobre o mundo é limitado. A espera pelo peito é angustiante, insuportável. É aqui e o bebê aprende que sugar o dedo ameniza a tensão na espera pelo peito.

 

Somos seres faltosos. Em nossas relações, o outro nunca pode suprir as nossas faltas. Compreender que esse lugar supridor de faltas, no qual tentamos colocar o outro, é tão faltoso quanto a nós mesmos, é angustiante; insuportável. Em qualquer relacionamento que seja ele, não buscamos o outro, e sim no outro. As expectativas que lanço sobre o outro sempre serão o dedo que posso sugar, na tentativa de amenizar a tensão oriunda de uma falta. Mas se reconheço que esse outro também é limitado, que suas faltas alimentam as minhas, gerando mais angústia e tensão, onde estaria o problema em criarmos um outro que não seja faltoso, que não seja finito, que não seja mortal, que não seja ausente e que não deixe de trazer o “peito” sempre que chorarmos?  

 

“Deus está sempre presente, ele é o meu refúgio e nada me faltará”. Por que esse discurso é comum na boca dos que acreditam em Deus?

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